sexta-feira, 30 de julho de 2010

Para quatro amigos solitários

Eu não gosto de relógios barulhentos. Tenho sempre a impressão de que eles, os relógios barulhentos, se deliciam em nos dizer que estão passando as horas. Só podemos percebê-los durante a madrugada.

"Tac", um minuto... "Tac" outro.

São como um compasso que ditam as batidas surdas do peitoafeto. Nos tornamos seres atentos as miudezas sonoras. Há uma certa beleza nessa solidão acompanhada. Com um pouco de vinho é a velha e bem conhecida grande Beleza de qualquer coisa.

Sentados no sofá vermelho, esperando a vida se tornar menos etílica, escutando as batidas surdas uns dos outros. Parados. As tristezas cotidianas, os relógios barulhentos, "tac", "tac" é assim que ocupamos o nosso silêncio.
Uma boa noite, um bom dia,
e caso eu não os veja mais; uma boa vida!

domingo, 11 de julho de 2010

Diálogo

Ele: Sim, eu já estou indo. O instituto médio legal é perto daqui. Preciso só de alguns minutos pra descansar. É que eu andei muito hoje, estou sentindo minhas pernas bambas.

Eu: …

Ele: Parece que algo súbito aconteceu, não sei bem se foi enfarto ou atropelamento. Eu não consigo pensar sobre isso direito. Acho que na verdade estou esperando pra pensar sobre isso depois. Se eu deixar pra pensar depois posso resolver melhor o que tem de prático pra fazer por agora.

Eu: …

Ele: Não havia ninguém lá, ninguém conhecido. Justo hoje. Eu sei que andar rodeado não significa necessariamente não estar só. Mas é que não tinha ninguém lá. Me dá um dos seus cigarros?

Eu: …

Ele: Não, eu não fumo.

segunda-feira, 5 de julho de 2010

Depois daquele beijo

Hoje me ocorreu que entrei em choque por esse período desde de 23 de Abril. Apenas não respondia mais aos estímulos. Quando se tem uma experiência de vida forte, é preciso tempo pra que as outras coisas retornem ao seu peso real.

Perdi um grande amigo nesse meio tempo, um amigo que morreu pelos pulmões. A morte por asfixia é das mais simbólicas. Morrer sem ar pra respirar é morrer por algo que sempre acontece, mas que nunca nos mata. Não é sempre que se tem ar pra respirar. E cotidianamente nos perdemos coisas, perdemos pessoas. A perda faz parte da rotina, faz parte do estar vivo, mas não há o que notar, é simples, perdemos pelo caminho dia atrás de dia.

Perder um amigo é ver a felicidade enfartando. Nem sempre há saída simples pra acontecimentos simples. Deixar que os céus se acalmem parece ser o mais sensato, mesmo comigo não acreditando em sensatez. Pular do trem em movimento só faz ralar na brita. Estar em choque está compreendido exatamente entre pular e deixar-se acalmar. É como uma pausa na respiração. Só que pausar não mata por asfixia.